Tribunal não leva médica e enfermeira a julgamento

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Sex, 17/10/2008 - 18:00


Não vão a julgamento a médica obstetra e a enfermeira envolvidas no caso do Gonçalo, a criança que nasceu com paralisia cerebral e uma incapacidade de 95%, em Fevereiro de 2003, na maternidade do hospital de Mirandela. O juiz decidiu, ao final da manhã, que, após ouvir vários pareceres e testemunhos, não havia motivos suficientes para pronunciar as duas profissionais de saúde. Os pais estão inconformados com a decisão e prometem recorrer para o tribunal da relação.  

O juiz de instrução do tribunal de Mirandela justificou a não pronúncia da médica obstetra e da enfermeira, acusadas pelos pais de serem responsáveis por todas as mazelas que o filho tem, pelo facto de nenhum parecer técnico ou testemunho de especialistas, ouvidos no âmbito da abertura deste processo, estabelecer qualquer relação de causa e efeito entre a conduta das profissionais de saúde e a condição do recém-nascido. O juiz considera não ter havido actuação dolosa, omissão de auxílio ou sequer ofensa à integridade física por negligência, durante o parto.

 

Confessa que foram fundamentais para esta decisão, os testemunhos de dois especialistas em obstetrícia, por serem específicos e consensuais na abordagem do assunto, nomeadamente por não garantirem que a presença da obstetra seria impeditiva de que a criança tivesse nascido sem as sequelas que são conhecidas.

Apesar desta decisão, o juiz diz que a não pronuncia da enfermeira Maria de Jesus foi mesmo no limite, porque considera que terá tido falta de competência técnica profissional, ao aperceber-se, na noite do parto e perante a ausência da obstetra no local, do aumento anormal do número de contracções e do ritmo cardíaco, devia ter telefonado de imediato à obstetra Olímpia Carmo e não apenas algum tempo depois.

 

Isabel Bragada, a mãe do Gonçalo, estava desiludida com a não pronúncia das duas profissionais de saúde, mas garante que não vai desistir e vai recorrer para o tribunal da relação. “Estamos muito desiludidos com a decisão do juiz porque houve indícios suficientes e por isso vamos recorrer para o Tribunal da Relação” garante. “Nós sabemos que as lesões irreversíveis do meu filho foram causadas pela não prestação de auxilio” afirma convicta.

 

Neste despacho, o juiz foi muito crítico para com o serviço de saúde prestado, dizendo mesmo que lidam com a vida de uma pessoa de forma banal. O magistrado incentivou os pais da criança, que pediram a abertura de instrução do caso, a pedirem uma indemnização e a processarem o Estado por entender que muita gente lida com a saúde sem lhe dar a importância que ela tem. Isabel Bragada vai aceitar a sugestão. “Vamos recorrer nos próximos 20 dias para o Tribunal Administrativo em termos de responsabilidade cível embora o nosso objectivo não seja a indemnização mas sim a penalização das pessoas responsáveis” refere.

 

Já o advogado de defesa da obstetra diz que finalmente foi reposta a justiça neste caso. António Lourenço revela que a sua constituinte teve um comportamento exemplar em termos profissionais. O advogado de Olímpia Carmo diz respeitar a decisão dos pais do Gonçalo em recorrerem, mas garante que será outra batalha a travar no momento certo, relembrando que a obstetra recorreu para o tribunal administrativo de Mirandela da suspensão de noventa dias sem direito a remuneração imposta pela IGAS, em Agosto de 2007, entretanto já cumprida. A justiça ainda não se pronunciou sobre este recurso.

 O Gonçalo, agora com cinco anos de idade, tem paralisia cerebral e uma epilepsia descompensada que necessitam de cuidados permanentes, implicando a deslocação ao núcleo de Vila Real da Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral, duas vezes por semana, para terapia ocupacional, fisioterapia e apoio técnico precoce. Como os pais trabalham, foi necessário contratar uma ama para cuidar da criança, sem qualquer apoio da segurança social, dado que o Gonçalo necessita diariamente de ser alimentado por uma sonda, de medicação, e anabolizações constantes.