Arqueóloga teme que parque eólico de Mirandela condicione candidatura à UNESCO da pinturas da Serra dos Passos

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Qui, 30/06/2022 - 09:50


Maria de Jesus Sanches, uma das maiores referências da arqueologia, em Portugal, considera que a instalação do parque eólico na Serra dos Passos/Santa Comba, no concelho de Mirandela, compromete uma possível candidatura a Património Mundial da Humanidade da UNESCO das pinturas pré-históricas existentes naquela área que alguns investigadores e arqueólogos estavam a pensar avançar num contexto mais abrangente em conjunto com mais três núcleos na vizinha Espanha.

Maria de Jesus Sanches, arqueóloga coordenadora da equipa que descobriu as várias figuras pintadas nos abrigos da serra dos Passos/Santa Comba, faz questão de ressalvar que a instalação do parque eólico não vai destruir o património já conhecido da serra.

“Tal como está formulado, não coloca em perigo os painéis conhecidos, ou seja, sob o ponto de vista da investigação, o parque não é um óbice, não destrói nada”, afirma.

No entanto, Maria de Jesus Sanches adianta que há cerca de dois anos que alguns investigadores estão a trabalhar no inventário para uma candidatura a património da humanidade da UNESCO de um conjunto de quatro núcleos, um deles da serra dos Passos/Santa Comba, o único em Portugal que concentra cerca de meia centena de abrigos com pinturas do período da pré-história (entre cinco mil anos antes de cristo e 2200 anos antes de cristo).

Aqui sim, Maria de Jesus Sanches não tem dúvidas que o parque eólico vem deitar por terra essa possibilidade

“O núcleo da Serra de Passos/Santa Comba é o mais ocidental de outros três de Castilha e Leon, que são o de Las Batuecas, o El Duratón e o El Valonsadero e o objetivo era ser uma candidatura conjunta como aconteceu com a pintura esquemática da área mediterrânea, classificada em 1998. Sob este ponto de vista, o parque eólico impede que o conjunto seja tido como um todo”, considera.

A arqueóloga acrescenta que o núcleo da serra dos Passos/Santa Comba era de extrema importância para o sucesso da candidatura à UNESCO

Maria de Jesus Sanches deixa entender que há várias atividades que são feitas com regularidade na serra que podem vir a ser prejudicadas com a instalação do parque eólico

A arqueóloga revela ainda que, desde 2014, por proposta da Direção Regional de Cultura do Norte, que lançou um concurso, vários investigadores e arqueólogos têm estado no terreno a classificar todos os abrigos pintados da serra dos Passos/Santa Comba.

Um trabalho que, diz, ainda não está concluído

Confrontada com estas declarações, a presidente da câmara de Mirandela reitera que o património classificado fica salvaguardado com a instalação do parque eólico e Júlia Rodrigues acrescenta que não tinha conhecimento oficial de qualquer candidatura a património mundial da Humanidade da UNESCO. “Desde 1986 que há várias investigações na serra e até agora nunca foi sequer mencionada a questão da candidatura da UNESCO. O que foi dito nas recentes jornadas de arqueologia aos investigadores e arqueólogos é que houvesse essa participação ao nosso PDM porque sob o ponto de vista jurídico a câmara municipal tem de cumprir o que está preconizado no PDM e em outros instrumentos de gestão territorial e estamos sempre reféns daquilo que está protegido e efetivamente o valor patrimonial que foi classificado e que está em vias de classificação está protegido. Relativamente à candidatura, pelo que me dizem os serviços municipais é que nunca houve essa pretensão”, referiu

A autarca acrescenta que existem opiniões muito divergentes sobre esta questão da compatibilidade das pinturas da serra com a instalação do parque eólico.

A instalação do parque eólico de Mirandela na Serra dos Passos/Santa Comba continua a ser alvo de diversas reacções. Escrito por Terra Quente (CIR)